Arruma-te comigo para dizer não!
Uma baddie. Ela tem – ou parece ter – o controlo total: posturada, impecável no visual e vive segundo as suas próprias regras. Mas será que essa liberdade é tão genuína quanto aparenta?
Sentimo-nos realmente livres para fazer o que desejamos ou estaremos nós mulheres, mais uma vez, a reproduzir uma ideia do que é desejável, moldada para corresponder às expectativas da sociedade? Se ele nos chama para backstage e aceitamos, temos de lhe dar algo em troca?
Há um tempo mínimo aceitável para permanecer num date que já é insuportável desde o início, só porque disseste “sim” ao convite? Chamadas de trabalho fora de horas são um sacrifício que realmente vale a pena? E se negares essa saída a noite passarás uma imagem de chata?
As minhas baddies, especialmente aquelas educadas para serem mulheres, sentem-se constantemente em dívida. E digo elas, mas poderia ser eu. A verdade é que eu sei que sabes que ir num encontro ou permitir que te paguem o jantar não significa mais do que isso… mas o que tu sabes é o mesmo que tu sentes?
O desejo de sermos vistas como donas de nós também pode tornar-se uma performance. A necessidade de sermos percebidas como “fortes” e “intocáveis” pode acabar por mascarar um tipo de vulnerabilidade que sentimos. E, mesmo enquanto mostramos que temos o controlo, ainda sentimos as pressões de sermos “agradáveis” ou “desejáveis”.
Numa geração que tanto abraça o fake it till you make it, será que estamos a tornar-nos naquilo que realmente queremos ser ou no que achamos que o outro – quem quer que esse “outro” seja – espera de nós?
Ser educada sem ser permissiva parece simples, mas, para muitas de nós, é uma batalha constante. Fomos treinadas para ser as guardiãs da vibe, enquanto os homens, bem… eles simplesmente “são assim”.
No fim deste artigo, proponho que te encontres em situações tipo que te geram essa pressão interna para agradar ou corresponder e que encontres no não uma poderosa ferramenta de auto-espressão.
Impostoras
Comecemos lá, no fundo: a educação binária (o rosa está para ela assim como o azul está para ele) constrói-nos para que, a fim de ficarmos bem na fotografia social, correspondamos a certos padrões desde muito cedo, mesmo que pelos acreditados “melhores motivos”.
Muitas de nós já experimentámos esse sentimento de corresponder aos desejos dos outros, ainda pequenas, em dinâmicas familiares onde o afeto e a aceitação dos outros pareciam condicionados… Fomos aprendendo a não causar discussões, a sermos bem vistas pelos professores, a sermos convidadas para os aniversários e a ter, pelo menos, um rapaz que nos queira namorar.
Aprendemos que, para sermos adoradas ou aceites, precisamos de retribuir, mesmo que isso signifique ignorar os nossos próprios desejos. Como, por exemplo, ficar em casa a ver Disney Channel e faltar à festa de anos, porque o mais importante é ser adorada, e as vezes A MAIS adorada.
Assim, interiorizamos uma falsa lógica: a de que o nosso valor está diretamente ligado à nossa capacidade de agradar.
Com isso, surge uma necessidade constante de compensar o que recebemos – seja um convite, um presente ou um gesto de carinho. Desta maneira, a gentileza, ao ser vista como uma troca, perde o seu valor e transforma-se num desafio – o de nos sentirmos merecedoras de tal. E será que alguma vez seremos?
E aqui entra uma dinâmica que é uma faca de dois gumes: raramente as mesmas pessoas que se esforçam constantemente para validar o outro acreditam na própria validade. Quantas vezes já pensaste: “é bom demais para ser real” ou “eu não mereço isto”?
Relatable? Sim, é o famosinho síndrome do impostor – uma voz interna que questiona o nosso merecimento e nos leva a duvidar até das nossas próprias conquistas.
Este sentimento de não sermos boas o suficiente é, sem muita surpresa, ainda mais comum nas mulheres. É por isso que prefiro chamar síndrome da impostora. E não é que a mistura do desmerecimento social com a tarefa de tornar tudo agradável fazem um dupe quase perfeito desse? Uma manifestação exacerbada pelas expectativas de género, que nos moldam a agradar e duvidar de nós mesmas, ao mesmo tempo.
Desiludir para alinhar: 3 perguntas para antes de dizer não.
Reconhecer esse padrão e o impacto da síndrome da impostora é um primeiro passo fundamental. Mas o que vem depois?
A mudança surge a partir de uma decisão consciente sobre quem queremos ser, e essa transformação exige algo desconfortável: a coragem de desiludir os outros e a capacidade de dizer ‘não’ ao que não nos serve. Isso implica desapontar expectativas, aprender a estabelecer limites e, acima de tudo, respeitar o nosso próprio espaço emocional.
Desiludir alguém, especialmente quem gostamos, é difícil. Tememos parecer egoístas ou matar a conexão. Mas, na verdade, este desconforto é o preço da autenticidade. Quando aceitamos o desconforto como parte das relações verdadeiras, damos espaço para uma comunicação mais honesta.
Como ouvi num episódio do meu podcast português favorito Bom Dia Obvious “Temos de ser corajosas para desiludir os outros.”. Isso não significa negligenciar as pessoas, mas sim reconhecer que os nossos limites não diminuem o nosso valor. Pelo contrário, dizer “não” com sinceridade fortalece a nossa identidade e ajuda-nos a alinhar as nossas ações com os nossos desejos reais. Infelizmente eu não vos consigo dizer qual foi o episódio que falou sobre isto, mas o episódio 69# / aprendendo a dizer “não”, é um ótimo snack para este tema.
Portanto, toma nota: a generosidade não deve ser movida por obrigação ou medo de desapontar. Quando agimos por vontade própria, o que damos é mais autêntico, e o equilíbrio entre cuidar do outro e cuidar de nós mesmas torna-se finalmente possível.
Aqui estão algumas perguntas para te ajudar a refletir antes de agir:
- Estou a fazer isto porque realmente quero, para agradar alguém ou evitar conflitos?
- Se dissesse “não”, sentir-me-ia culpade ou protegia os meus limites?
- Este gesto reflete a minha vontade ou apenas uma expectativa imposta?
Responder a estas perguntas ajuda-nos a distinguir entre agir com generosidade e sacrificar o nosso bem-estar.
Se queres aprofundar esta reflexão e aprender a alinhar as tuas escolhas com o que desejas de verdade, faz o download do nosso caderninho de apoio ao sussexo: Sexy Journaling: Desiludir para Alinhar do Insegurança Social.
Recalibrando a Nossa Generosidade
Então, é isso: a empatia genuína é um ato livre, enquanto o auto sacrifício faz-nos colocar as necessidades dos outros acima das nossas, sobrecarregando-nos com expectativas que não são nossas.
Ser uma baddie não é sobre maquilhagem impecável ou outfits perfeitos. Não é sobre corresponder a expectativas externas – sejam da sociedade, dos amigos, bagaços ou de nós mesmas. Ser baddie é ter a coragem de ser autêntica, mesmo que isso signifique desiludir, questionar ou desconstruir as ideias que construímos ou construiram sobre quem deveríamos ser.
Claro que, às vezes, temos de ceder ou engolir sapos porque a realidade assim o exige. Mas, quando nos permitimos voltar a nossa atenção para o que realmente nos importa e o que é apenas um peso de outre ou uma tentativa de nos testar, podemos agir em defesa dos nossos próprios interesses e experimentamos uma leveza e uma conexão maior.
É sobre recalibrar a nossa generosidade: quando tanto um não como um sim vem de um lugar nosso e não do outro, deixamos de ser apenas uma estética: tornamo-nos verdadeiramente MÁS 😈💋
Nota: As estatísticas mencionadas neste artigo são baseadas nas respostas fornecidas pelos seguidores do Insegurança Social no Instagram.