Uma coisa da qual não abdico? Romantizar a minha vida, encontrar propósito em tudo.
E nada melhor para uma romântica incurável do que aqueles momentos que mudam tudo – os gatilhos narrativos, os catalisadores. Pequenas coisas, gestos, conceitos, que de repente nos fazem ver e falar de outra forma.
Neste texto conto-vos porque o PIPY é exatamente isso: um ponto de viragem, um convite para a sexualidade da mulher em espaços mais públicos e generalistas, para pensarmos sobre como pensamos nela.
COLECIONADORA DE DETALHES
Vi muitas opiniões rígidas sobre o bem-disposto PIPY (da mais recente marca de bem-estar íntimo portuguesa eu sou gira), e a cada uma, dei toda a minha atenção.
Afinal, como mulher (que, por acaso, é profissional na comunicação para a sexualidade), gosto de saber como elas se sentem. E dei por mim a tentar perceber que filtros, que tabus e que narrativas ainda nos moldam em 2025, mesmo com toda a popularização do discurso mais aberto sobre prazer e auto-estima.
Não podia mais viver com esta sede de saber mais sobre o que as pessoas estavam a dizer. Já sabia tudo: ingredientes, opiniões, pareceres de ginecologistas, relatos de cheiros no TikTok, como é embalado, como os marketeers estavam aproveitam o fenómeno… Só faltava mesmo uma coisa – talvez a mais importante de todas,- experimentá-lo.
Então tratei disso, finalmente ia ser a minha vez.
Quando chegou, parecia um acaso perfeito: a seis dias do meu Galentine’s com as amigas. Já sabia que ia ser uma noite memorável, mas com ele? Imaginei-nos na casa de banho da festa, a trocar borrifadelas entre confissões sobre os últimos dois meses sem nos vermos. Nestas noites, também há sempre um evento catalisador, aquela personagem inesperada que, de repente, muda o rumo da história e depois desaparece por um tempo. Toda a boa narrativa é feita de personagens, principais ou não, a história não seria a mesma sem elas…
Qual seria a história da nossa noite? Quem seriam as personagens que ainda não conhecíamos e que poderiam fazer parte da nossa longa história de amizade? Um gostoso que pede o número à minha amiga, uma mulher que nos elogia o sapato e, de repente, nos leva para outra festa, uma motorista da Uber num dia mau, ou o PIPY…
Vou ser sincera, eu tenho pensado muito em que personagem será o PIPY:
Notei que para muitos é vilão, mas se o PIPY fosse um vilão, qual seria o seu crime? Sedução em primeiro grau? Manipulação do desejo? Um plano maquiavélico para perfumar corpos e confundir mentes? No tribunal da opinião pública, ele já foi acusado de muitas coisas: de alimentar inseguranças, de cheirar a submissão, de vender um prazer embalsamado. Mas honestamente, essa maneira de o ver não me faz sentido. Se assim fosse escolheria ver um mundo onde toda a cosmética íntima é um delito, e onde qualquer tentativa de artificialização – mesmo consciente e informada – deve ser combatida.
O que é engraçado é que as mesmas pessoas que o sentem vilão quase que o acabam por pôr num pedestal de herói… Como se ele tivesse prometido libertar as mulheres da vergonha, dár-lhes um super poder de confiança instantânea e transformar cada encontro num espetáculo cinematográfico. E eu entendo, vindo da Cristina Ferreira, uma das mulheres mais populares da atualidade portuguesa, essa aura era quase inevitável. Mas não vamos confundir as coisas… Somos todas crescidas para saber que nunca um frasco carregaria tanto poder.
O PIPY nunca sonhou ser esse tipo de salvador e estas promessas foram feitas não por ele, mas pelos seus opositores, os mesmos que o preferem ter como vilão.
Na verdade, o PIPY não salva ninguém, nem destrói nada. Não é um manifesto feminista, mas também não me parece de todo um golpe do capitalismo. É só uma bruma íntima, como já existem outras tantas. Mas também é muito mais do que isso, porque tudo o que tocamos ganha camadas, significados.
Além de tudo o que senti, foi que o PIPY veio reforçar os nossos conhecimentos sobre a saúde da vulva e abrir o discurso para a cosmética íntima, um tópico sex-positive que exige exatamente este tipo de diálogo e informação para que as pessoas façam escolhas mais seguras. Ou vão dizer que nunca borrifaram perfume nas coxas antes daquele date, ou mais relatable ainda, nunca se perguntarem se a outra pessoa sentia o cheiro da mesma maneira que vocês?
Ele certamente não é a solução, mas tão pouco o problema… Ele não é herói nem vilão, mas não há dúvidas de que tem um papel fundamental na história. O tal elemento que mexe na trama, que obriga as personagens a tomarem posições, que faz com que revelem o que já estava lá dentro. Ele não cria inseguranças, mas expõe as que existem. Não resolve questões de auto-estima, mas põe o dedo nelas.
Não, não é uma revolução feminista, mas muito menos um inimigo do empoderamento – é apenas um espelho, e cada uma vê nele o que já carrega dentro de si, no fundo, é como aquela cueca da sorte…
APENAS A MINHA EXPERIÊNCIA PESSOAL:
Não me deu comichão nenhuma, e de facto, o meu apetite sexual aumentou, a minha confiança no trabalho também.
Não sei se foi o cheiro do PIPY, o facto de o ter sempre comigo na mala, as conversas que tive com as minhas amigas, a lua… ou simplesmente o efeito de me reconectar com as minhas vontades, em vez de procurar que os outros me vejam nas suas.
E, se calhar, esse é o verdadeiro efeito do PIPY: um convite para nos sentirmos mais nossas.
Se era preciso o PIPY para isso? Pelos vistos, sim. As personagens secundárias existem mesmo para isso, mas no fim não é sobre elas, pois não? É sobre nós.
Texto maravilhosamente ilustrado por Ultimaweapon, confere aqui o seu trabalho.