SUSSEXO: SEX MAGICK 101

by | Nov 1, 2024

E se o prazer que sentes fosse uma escada rolante para os teus desejos mais profundos?

Há alguns meses, nós (as Basic Witches, também conhecidas como GG Sauvage e Leah Knauer) praticámos sex magic – ou sex magick, como também se escreve – para publicar na Cosmopolitan. E funciona? O simples facto de estares a ler isto agora prova que sim. Como comediantes, bruxas e co-apresentadoras do podcast Basic Witches, percebemos que mais pessoas precisam de conhecer as possibilidades do sex magic. Já falámos com vários tipos de bruxas sobre a magia de transmutar a energia sexual e não temos vergonha de dizer que já alcançámos muitas manifestações através dos nossos orgasmos.

Assim começa o artigo das Basic Witches, publicado em 2021 na Cosmopolitan. Esta dupla, composta por GG Sauvage e Leah Knauer, combina humor e espiritualidade para promover uma visão inclusiva e contemporânea da magia e do empoderamento feminino através do seu podcast e redes sociais, em inglês.

Durante os episódios, elas usam muito a pergunta “No que acreditas?” — algo que me chamou a atenção, pois, ao contrário de “O que achas?”, que pode ser influenciado por fatores externos ou pelo senso comum, “No que acreditas?” fala diretamente ao coração. Esta pergunta convida a uma resposta mais pessoal e profunda, centrada nas crenças e experiências íntimas, em vez de uma opinião superficial, que pode ser moldada pelo que se considera socialmente correto ou credível.

A magia é claro, para quem acredita, mas este artigo pode também servir como um guia para quem deseja reconectar-se consigo próprio. Acreditar é o que transforma a intenção em manifestação, e aqui partilho o essencial para quem quer sentir-se poderoso e no controlo do seu prazer.

 

Sexo e Magia o que têm em comum?

Sabes quando o Boss AC diz que “fazer amor contigo é ir ao céu e voltar”?

Talvez ele não esteja a exagerar tanto assim. A energia sexual, muitas vezes reduzida ao prazer físico, é, na verdade, uma das forças mais criativas que todes possuímos. Essa força não é apenas uma fonte de prazer; ela pode ser transformada em algo mágico, como veremos a seguir.

Em várias culturas e tradições espirituais, acredita-se que essa energia pode ser canalizada para criar muito mais do que apenas vida física, as in, bebés.

E por falar em canalização dessa energia , vale a pena passar olho na história deste tema que apesar de escondido, nunca saiu de perto de nós, nem de nós.

Desde tempos antigos, práticas como o tantra já reconheciam o potencial do sexo para reconetar o praticante com a sua essência física e espiritual, tornando-se uma fonte de cura e transformação.

Essa tradição milenar ensina que o prazer sexual — seja a solo ou acompanhado — nos permite alcançar um estado de êxtase, como se, de repente, entrássemos num espaço entre o sonho e o real, entre o individual e o todo, e é nesse espaço liminar, onde nos sentimos conectados ao universo, que a verdadeira magia acontece.

Assim como o tantra, não vê o sexo apenas como uma experiência de prazer, mas como um verdadeiro portal para o autoconhecimento e a união do corpo com o espírito, a sex magick parte desta mesma premissa: o orgasmo, mais do que uma simples explosão física, é visto como uma poderosa força mágica. Neste contexto, ele não serve apenas para prazer imediato, mas como canal para manifestar intenções e desejos, transmutando a energia sexual em algo maior. Como disse um amigo meu, “o orgasmo é como uma varinha mágica”, capaz de materializar sonhos e alinhar corpo e espírito.

Talvez te perguntes: “Isto é mesmo uma cena?” A resposta é sim, sempre foi — embora em alguns tempos mais do que outros. As raízes da sex magick remontam ao século XIX, com figuras como Ida Craddock, Randolph, Maria de Naglowska e Aleister Crowley, que procuraram afirmar a magia sexual como uma ciência da sexualidade, explorando até a psicologia que lhe cabe.

Frame do filme “The Love Witch”

No entanto, a história da sex magick é marcada por um duplo tabu: o sexo e a magia.

Estes dois foram marginalizados e oprimidos, especialmente em contextos patriarcais e misóginos.

Apesar de muitos efeitos da sex magick terem sido observados e até documentados cientificamente, o desconforto em relação a estes temas persistiu. Mesmo no caso de Crowley, um homem branco, a sociedade da sua época percebia-o como uma figura demoníaca e perversa, reforçando o estigma em torno de tudo o que envolve sexo e magia.

Este tabu reflete-se também na luta de grupos marginalizados, que continuam a desafiar normas e a quebrar barreiras, utilizando a sex magick como uma forma de empoderamento e de resistência contra a opressão em torno da sexualidade e do género. Por tudo isso, praticar sex magick torna-se não apenas um caminho de transformação individual, mas uma poderosa ferramenta de reclamação do corpo e do poder que ele tem.

Para aprofundar ainda mais a nossa compreensão sobre a sex magick, é importante entendermos a terminologia que a envolve, começando pela escolha do ‘K’ em vez de ‘C’, que revela a intenção por trás dessa prática.

 

Porque usar o K no fim de magic?

Se já leste sobre sex magic, talvez tenhas reparado que a palavra “magic” aparece com um K no fim — magick. Esta distinção não é apenas estética, mas carrega um significado profundo e simbólico, especialmente para aqueles que praticam magia moderna.

O uso do “K” no fim da palavra foi popularizado por Aleister Crowley, já mencionado anteriormente neste artigo, que queria diferenciar a magia espiritual, esotérica e ritualística da “magia” associada ao entretenimento e ilusionismo. O “K” também tem raízes etimológicas na letra grega “kappa” e no número 11, que Crowley via como um símbolo de poder espiritual e de ligação entre o plano físico e o espiritual.

Para Crowley, a magick não era apenas um conjunto de rituais, mas uma prática transformadora, capaz de mudar realidades internas e externas. Hoje, essa distinção continua a ser usada para enfatizar a diferença entre a magia que visa transformação pessoal e manifestação consciente, e a magia de espetáculo.

Portanto, quando falamos de sex magick, estamos a falar dessa energia transformadora — a fusão entre o físico e o espiritual — e do poder de manifestação que surge dessa união. O “K” no final não é apenas um detalhe; é um lembrete de que estamos a lidar com uma força profunda e ancestral.

 

Rituais de Sex Magick: Dos e Don’ts

Agora que já estabelecemos uma base sobre a energia sexual e a importância da sex magick, vamos explorar como esta prática pode ser aplicada como uma força criativa e transformadora. É importante notar que este é um processo muito íntimo e cada um saberá e sentirá qual a melhor maneira de transformar o seu prazer em poder. No entanto, vamos falar de algumas considerações que são gerais.

Existem diversos rituais e maneiras de praticá-la, como ejacular dentro de um ovo, contar de 93 para trás e te vires no 0, entre outros.

O princípio básico é a definição de uma intenção clara, utilizando o ato sexual para alinhar essa intenção com a tua energia. O orgasmo, nesse contexto, serve como um canal para libertar essa energia para o universo, acreditando no seu potencial para transformar e concretizar a tua intenção. Essa última é a chave para o sussexo: acreditar profundamente que essa energia tem o poder de concretizar os teus desejos é o combustível de qualquer ritual.

Morticia Addams do filme “Addams Family” 1991

 

Dos

  • Definir uma Intenção Clara: Antes de qualquer ritual, decide o que desejas manifestar. Seja amor próprio, sucesso profissional ou cura emocional, é crucial que tenhas clareza sobre o teu objetivo. Por exemplo, em vez de “quero não me sentir sozinhe”, opta por afirmações como “quero atrair conexões profundas e amorosas”. Essa intenção guiará todo o processo.
  • Praticar a Solo ou em Conjunto: Podes fazer sex magick sozinhe, através da masturbação, ou em conjunto com outra pessoa. Quando praticado com alguém, o consentimento mútuo é essencial. Ambos devem estar alinhades na mesma intenção, trabalhando juntes para canalizar e libertar essa energia.
  • Visualizar a Concretização: No momento em que te encontras “in the zone” — nesse espaço entre a realidade e o sonho — e estás prestes a atingir o orgasmo, foca-te na visualização do que desejas manifestar. Não só vê essa intenção realizada, mas também sente-a. Tenta envolvê-la com outros sentidos: como seria o cheiro, o gosto ou a sensação de estar nesse momento que estás a criar? ESTA PARTE É TÃO SEXY UAU!!
  • Proteger a Tua Energia: Escolhe o momento certo. Amuletos, velas, ervas como o alecrim e cristais podem ajudar a criar uma sensação de segurança e proteção. Algumas pessoas também preferem praticar em locais que consideram espiritualmente seguros.
  • Manter a Mente Focada: Durante o ritual, tenta evitar pensamentos intrusivos. Mantém a tua mente focada na intenção, criando um ambiente mental e emocional propício para que a tua energia flua sem distrações.

 

Don’ts

  • Manipular Desejos de Outras Pessoas: Sex magick não deve ser usada para manipular os desejos ou sentimentos de outres. Forçar a vontade de outres pode resultar em efeitos indesejados, tanto para ti como para a outra pessoa. A magia é mais poderosa quando respeita o livre arbítrio.
  • Ignorar o Consentimento e o Alinhamento Energético: Se estiveres a praticar com outra pessoa, é importante que ambos estejam na mesma sintonia energética e emocional. O consentimento é um pré-requisito absoluto, tanto para a prática quanto para o alinhamento da intenção.
  • Negligenciar Emoções Profundas: A energia sexual pode trazer à tona emoções intensas e profundas. Por isso, é importante estar preparade para o que possa emergir durante o processo. Trabalha com essas emoções de forma consciente e respeitosa.
  • Esquecer a Ética e o Respeito: Sex magick é uma prática poderosa e, com grande poder, vem grande responsabilidade. Nunca uses esta prática para causar dano ou forçar situações, e lembra-te sempre da importância da ética e do respeito por ti e pelos outros.

 

E se o sexo for mais do que orgasmos e bebés? E se o sexo for parte de tudo?

Crescendo numa sociedade tradicionalmente católica como é a portuguesa, muitos de nós fomos ensinados a associar o desejo e o prazer a sentimentos de culpa e vergonha. A magia sexual desafia essa narrativa, recuperando o prazer como algo natural, poderoso e transformador, onde o orgasmo é um flashback do teu maior potencial, não um erro a ser evitado.

A magia que encontramos na sexualidade é tão evidente quanto a magia que torna o amor inexplicável. Se sexo for uma expressão mágica que ultrapassa o físico e nos liga aos nossos maiores desejos, como te sentes em relação a esta perspectiva? E se tu não o sentes, dormias com alguém que o sentisse assim?

Utilizar o meu prazer e a minha energia sexual como ferramentas para me conectar com os meus objetivos faz-me sentir empoderada e alinhada com aquilo que desejo sentir no futuro. Esta prática não apenas me libertou do vazio e da vergonha que uma vez carreguei, mas também me abriu as portas para um autoconhecimento transformador. Assim como as Basic Witches, defendo que a magia para e de connosco mesmos é acessível a todes, e que cada um deve sentir-se segure e confiante na sua prática.

Este artigo visa dar visibilidade a uma vertente mais profunda da sexualidade que, muitas vezes, é mal interpretada, mas que tem o potencial de oferecer efeitos verdadeiramente positivos e transformadores nas nossas vidas, seja para atrair um emprego de sonho ou simplesmente para experiênciar um orgasmo transformador.

Se te sentes orientade para explorar esta prática, experimenta reservar um tempo para ti, estabelecer uma intenção clara e deixar que o prazer te conduza a essa transformação, lembra-te de que o verdadeiro poder reside em ti. A magia não está apenas nos rituais ou nas intenções; ela está na tua capacidade de te conectares com a tua energia e de acreditares que mereces manifestar os teus desejos.

Sophie-Anne Leclerq de “True Blood”

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